Texto: Mariana Ciscato (@mariciscato).
Hoje em dia, para qualquer coisa na vida, é preciso algum método. Quer dormir melhor? Monitore seu sono com um smartwatch, leia o artigo com cinco técnicas infalíveis para pegar no sono, tenha o mínimo de horas que um coach qualquer definiu considerando apenas a realidade conhecida.
E que tal um hobby? Mas aí você precisa fazer uma imersão no TikTok para entender tudo sobre aquilo, comprar equipamentos e materiais específicos que profissionais indicaram, e se você não dedicar um tanto de horas a isso, é melhor nem começar.
Absolutamente todas as áreas da nossa vida foram engolidas pela lógica da performance e da otimização. Dirigir enquanto ouve um podcast sobre desenvolvimento pessoal, lavar a louça enquanto assiste a um vídeo sobre os melhores prompts para testar com IA. Parece que perdemos a capacidade de nos concentrar em apenas uma coisa, ou simplesmente de não estar fazendo nada.
Qual foi a última vez que você divagou olhando pela janela? Quanto tempo fazendo nada você é capaz de aguentar sem começar a pensar na lista infinita de coisas que precisa ou quer fazer? Adam Phillips já disse que vivemos sob a tirania do superego: aquela voz que nunca se dá por satisfeita e está sempre cobrando um pouco mais. É ela quem lembra que você podia ter entregue um trabalho mais completo, alcançado um pace melhor na corrida de domingo, conversado mais com o amigo de infância que visitou a cidade nesta semana. Que podia ter lavado a roupa em vez de se perder no feed do Instagram, ou passeado com o cachorro enquanto jogava alguma coisa online.
Vou te contar uma coisa: a lista nunca acaba, e nós fomos convencidos a acreditar que só não termina porque não nos esforçamos o suficiente. Como diriam nossos mestres maiores: é preciso estar atento e forte. Não dá para cair nessa cilada.
Fomos ensinados a desconfiar do que é leve. A achar que só tem valor o que dói, o que custa ou o que rende. Dia desses Adelaide Ivánova levantou a bola, eis o que ela disse: “Em momento de crise, costumamos perguntar para que serve a poesia ou o amor?, mas quase nunca perguntamos para que serve o aluguel? ou o trabalho?
Em que momento passamos a colocar em xeque as coisas que nos humanizam e nos conectam, enquanto aceitamos sem questionar as que nos moem?
O que nos falta é desobediência. Voltar a fazer coisas que servem apenas para existir. Ter um hobby e ser ruim nele, ler um livro que não vai alavancar sua carreira, encontrar amigos para ficar de bobeira. Deixar a performance com as IAs e nos concentrar em ser o que robô nenhum será: uma confusão desordenada de células e oxitocina.











Deixe o Seu Comentário