Caros vizinhos, se me virem parado na varanda, olhar perdido entre as maritacas e o nada, um nada que, aliás, tem me interessado bastante, não se assustem. Não é AVC, é só crise existencial. Vale também pra vocês, meus colegas de futebol: quando eu erro aquele gol que até uma criança de três anos faria, e fico ali olhando pro chão, fingindo amarrar a chuteira, não é vergonha, é crise.
Daqui a dois meses completo trinta anos. E percebi, com um certo atraso, que já descobri tudo o que não quero ser. O problema é que talvez precise de mais trinta pra descobrir o que quero ser. A vida adulta tem dessas ironias: você passa metade do tempo fugindo de uma coisa e a outra metade tentando entender de que está fugindo. Não que eu tenha ficado parado até aqui. Fiz de tudo um pouco: fui office boy, ajudante de alfaiate, recepcionista, auxiliar de escritório, jornalista, publicitário, uma carreira sólida no improviso.
Eu venho de um lugar onde crise existencial é luxo de quem já resolveu o resto. Lá, as crises têm nome e vencimento: gás, aluguel, emprego. De existência, só por engano. E aí pronto, entro em crise por estar em crise, o que é praticamente um desrespeito ao CEP onde nasci.
Não sei se é culpa da idade, da pandemia atrasada ou desse algoritmo que insiste em me vender cursos pra descobrir “meu propósito em 7 dias”. O que eu sei é que, pela primeira vez, não quero só continuar, quero entender. Talvez não o mundo inteiro, que já é demais, mas pelo menos o meu pedacinho dele.
E se, por acaso, vocês me virem na varanda outra vez, olhando pro nada e parecendo meio fora de área, não chamem a ambulância. É só um rapaz de quase trinta anos tentando descobrir se ainda dá tempo de recomeçar, ou, com menos cansaço nas pernas e um pouco de sorte, de ainda ser jogador de futebol.











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