Texto: Elias Cavalcante (eliacavalcante).
É chegado o fim da construção do prédio aqui da frente. Onde antes era só poeira e tapume, abriram-se quartos, cozinhas conjugadas, e sacadas onde, imagino, famílias vão se pendurar nos domingos para vigiar a rua. Vinte andares, dois apartamentos por andar. Dois anos de obra. E agora, fim.
Da minha janela, já quase não ouço as máquinas engolindo concreto, nem a turma do reboco tirando sarro da turma da serralheria. Os operários que, depois do almoço, se enfiavam atrás das árvores para fumar um baseado também desapareceram. Sumiram até os gritos do rapaz das marmitas, o homem que berrava “olha a boia!” O bordão virou trilha sonora do condomínio. De tempos em tempos alguém gritava do 9º ou do 3º: olha a boia!, e eu, sim, já fui um deles.
Mas agora é outra fase. Chegou a vez da turma do acabamento. Gente que entra, ajusta o que falta e sai, sem tempo de criar intimidade com o prédio, sem participar do dia a dia da obra. Sempre achei que fossem os mais tristes: chegam quando a festa já terminou.
Confesso, senhores, que no começo desejei a vocês o pior. Não pessoalmente, claro, o pior para a obra. Uma chuva infinita, um embargo, uma greve, qualquer coisa que me devolvesse um pouco de paz, porque sou desses que trabalham de casa, tentando escrever, ler, pensar, ouvir. E vocês, às sete e meia da manhã, vinham com britadeiras e bom humor, as duas únicas coisas que ninguém quer antes do café.
Mas aos poucos fui gostando de vocês. Viraram companhia. Passei até a vibrar junto quando, às duas da tarde de uma sexta-feira, via a turma descendo a rua animada, quase dançando na direção do bar, do ônibus, da vida comum.
E agora, senhores, vocês vão embora. Vão erguer outros prédios, inventar outros horizontes. Ficarei aqui torcendo para que os futuros vizinhos de obra tenham a mesma sorte que tive — que enxerguem vocês com esse misto de poesia e afeto que, até pouco tempo atrás, eu nem sabia que tinha.
Um abraço do amigo,
Elias, morador do 12-B.











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